quarta-feira, 8 de julho de 2009

Voar

Bem, meu querido, parece que decidiste que vamos viajar juntos.
Saí do táxi à porta do aeroporto e caminhei para a zona das partidas levando apenas uma pequena mala de bagagem de mão. Caminhei naquela confusão de partidas e de chegadas, de sorrisos e lágrimas, de paixão e ódio até à zona da segurança. Despi o meu casaco forte e tirei o meu fio e caminhei para a zona segura e tu, surpreendentemente, apareceste; chegaste do nada como um raio de sol depois na mais terrível tempestade. Agarraste a minha mão gelada com a tua mão quente e entrelaçaste os teus dedos nos meus, como se te pertencessem.
Esperamos, afinal é o que se faz no aeroporto. Eu encostei a minha cabeça no teu ombro e respirei-te, absorvi-te e guardei-te em mim, decorei o teu aroma em mim, guardei-o secretamente no compartimento das saudades para abrir sempre que necessário. E tu, tu ias afagando o meu cabelo com a delicadeza com que os joalheiros manuseiam os seus, mais valiosos, diamantes.
Chamaram. O nosso voo ecoou em todo terminal.
Sorriste-me levemente e caminhamos para o autocarro que nos levaria até ao avião. Deixaste-me subir em primeiro lugar e fomos durante todo o caminho, entre solavancos e apertões, a olhar-nos nos olhos. Eu a olhar para os teus olhos cor de fumo e tu para os meus, cor de sol poente.
Quando apertávamos finalmente o cinto de segurança e levantamos voo, beijaste-me a testa e deste-me a mão. Tu sabes que eu odeio levantar voo.
Leste para mim. Quando pudemos finalmente tirar os cintos de segurança e os descansos entre cadeiras, eu recostei-me em ti e tu leste para mim. Falavas num tom claro, decidido e forte. Pouco a pouco ias-me embriagando com tão maravilhosa sonoridade.
Aterramos. Agora foi a tua vez de respirar mais fundo. Odeias aterragens. Sorri para ti, depositei-te o meu mais terno e duradouro sorriso, dei-te o sorriso que te daria sempre e para sempre.
Estava a chover. Eu apertei casaco preto e tu ajeitaste-me a gola enquanto vestias também o teu casaco. Caminhamos de mãos dadas, enquanto bebíamos um chocolate quente e descobríamos aquele país tão nosso, aquele país que surgia quando as nossas fotografias eram relevadas.
Quando finalmente anoiteceu e rumamos ao hotel eu achei que não havia momento mais perfeito, não havia momento mais perfeito do que aquele em que eu me deitaria ao meu lado e tu te aninharias em mim enquanto passavas a mão sob a minha barriga. Quando finalmente adormecesses eu ia sentir a tua respiração calma e profunda até eu própria adormecer.
Não, não fizemos amor nesta noite. Afinal temos uma vida inteira pela frente… Que importância tem uma noite quando nos espera a eternidade?
Quando acordei estavas de pé, junto à janela a contemplar o nevoeiro e o silêncio. Levantei-me da cama, beijei-te o ombro e enquanto te abraçava disse:

Adoro-te, meu querido.


In: Underground, London.

1 comentário:

  1. Mais uma divagação que eu consegui viver dentro da minha cabeça na perfeição, lindo as always :)

    ResponderEliminar