terça-feira, 23 de junho de 2009

Voltar a ti

Hoje consegui.
Hoje consegui desenhar os teus traços mais gerais numa folha de papel branca, vazia e triste.
Hoje diminui o tempo que resta até que te partilhe com o Universo porque, é o que um dia farei, um dia juntarei todos os esboços do teu retrato que tenho espalhados pelo chão e nas paredes no meu quarto e pintar-te-ei com tinta-da-china num edifício da capital para que toda a gente te veja e te descubra, pouco a pouco, como eu fiz.
Já tinha tentado desenhar-te antes, mas era impossível. A memória atraiçoa-me e apesar de me sentar num canto escuro a focar-te e a ouvir a “nossa” música não consigo. Dizem que apenas não esquecemos os aspectos mais negativos e é verdade, não esqueci os teus hábitos de fumador, não esqueci que róis quase desesperadamente as unhas mas já esqueci a forma como o teu cabelo faz aquela ondulação, já esqueci a profundidade dos teus olhos, já esqueci o teu cheiro numa das tuas camisas brancas.
Amanhã gostava de acordar ao teu lado.
Gostava de acordar e ficar a ver-te dormir enquanto os primeiros raios de sol dançariam descaradamente sob a tua pele. Queria conhecer o teu bom humor matinal e levar-te o pequeno-almoço à cama. Gostava, acima de tudo, de te mimar porque sempre soube e sei que é disso que precisas, desesperadamente.
Sabes como seria acordar contigo?
Não?
Não acredito. Não acredito porque tal como eu, já construíste infinitas vezes este cenário na tua cabeça. Ainda assim vou-te contar, por isso fecha os olhos e ouve. Quando eu ainda estivesse a dormir, ficarias a olhar para mim e acordavas-me com um beijo suave, que tinha como objectivo não me acordar, mas ficarias feliz quando eu abrisse os meus olhos e te visse. Eu iria sorrir e afagaria os teus cabelos antes de te beijar os lábios e permitir que seguisses para a tua rotina diária. Quando voltasses a aparecer junto a mim com o cabelo molhado, com cheiro a gel de banho e a vestires a camisa eu levantar-me-ia da cama e ficaria frente a ti, olhos nos olhos, enquanto te faria o nó na gravata. Depois do último beijo voltaria para a cama e voltaria a adormecer, com a cabeça na tua almofada, anestesiada no teu cheiro.
Não consigo evitar em soltar uma gargalhada. Não sou louca, estou a rir porque, inacreditavelmente, consigo ouvir a tua resposta. Dizes-me: “Uau, amanhã quero mesmo acordar ao teu lado”.
E sabes que mais, meu amor?
Amanhã vais acordar ao meu lado.
Amanhã, depois, daqui a um mês, daqui a um ano, daqui a vai-se lá saber quando

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