quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Nua (II)

Aproxima-se e fixa o seu olhar no dele. Fixa os seus olhos esverdeados pelo sol nos olhos escuros dele e volta a sorrir-lhe com a malícia desenhada nos seus lábios macios. Enquanto sorri, desliza, suavemente, o seu dedo indicador sob o ombro nu do seu homem mistério.

Desenha um círculo, e outro sob a pele.

Ele, relembrando-a que afinal não é assim tão inocente, pega-a fortemente pelo pulso e ao puxa-la para si sentando-a no seu colo.

Ela admirada solta uma gargalhada harmoniosa no ar e aproxima-se dele, enquanto encosta o seu nariz sob o pescoço e aspira-o. Respira-o e prova-o, como quem degusta um vinho tinto… Sente e deixa-se percorrer pelo aroma que a percorre e a inunda.

Com a sua mão gelada, percorre suas as costas lentamente fazendo-a arquejar a cada passagem por cada vértebra.

Sorri, deliciado com a loucura que envolve o corpo dela.

Levanta-se, suportando-a como uma pluma e encosta-a na parede, gelada, pálida, suave e intocável, como ela... Subitamente, a pele dela adquire uma textura que não é suave nem delicada, são pequenos focos de luz inflamados… Envolve a cintura dele com a sua perna de ginasta e aproxima-o. Junta o seu peito delicado ao dele, forte e musculado.

Olha-o de novo.

Lambe os seus lábios e afasta-os, lentamente, enquanto os aproxima dos dele…

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Nua (I)


Simples, clara e serena repousa uma musa sobre os lençóis brancos como a neve, quentes como o inferno e loucos como o paraíso. Dorme, harmoniosamente, nua deixando-se revelar, em pequenos goles, por entre os permeáveis lençóis.

Dorme nua. A sua mão assenta num cume gémeo em perfeição, cume que se assemelha a fruta de época madura, doce, sumarenta e repleta e cores e sabores; a outra mão desliza por entre os cabelos negros e revolteados espalhados sem nexo na almofada desenhando mil sombras da noite, das noites…

Arrepiada, a pele conta a sua história em cada toque e gesto, como um livro em Braille revela a história que nele foi gravada.

Respira.

No seu rosto elevam-se os lábios rosados e magoados que murmuram em silencio memórias e gestos gravados…

Acorda.

Enquanto rebola e desliza por entre os lençóis o sol reflecte no seu rosto. As pestanas tornam-se janelas de sombras curiosas, as faces iluminam-se com o sol e os olhos, meio acordados, espelham o nascer do sol sob o rio…

Sorri.

Afinal os seus olhos não reflectem apenas no sol…

Levanta-se e caminha, serpenteando, até ele.

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Silêncios

Deslizam silenciosamente pelas teclas os dedos que insististe em calar, saltitam entre uma tecla e outra procurando gritar todas as palavras que se calam e que se calarão, para sempre.
Disseste-me, quase até à exaustão, que para ti e para mim, que para nós, não existiam os silêncios e que o dia da partida não chegaria… Afirmaste-o e prometeste-o a pés juntos. E foi verdade, os silêncios não existiram e quando se calavam as palavras gritavam os olhares, os sorrisos, as sensações e tudo aquilo que não tem som junto dos ouvidos, mas junto do coração. Depois, mesmo quando as palavras já eram ditas de cor não passaram a ser mais banais nem sem significado, eram… Tesouros… Pequenas pedras preciosas que guardava no bolso do lado esquerdo, o lado mais próximo de ti. Até ao dia da enorme tempestade, o dia em que os trovões riscavam o céu, as nuvens pareciam querer atingir a Terra e no ar apenas sobrava o silêncio, o silêncio da partida, interrompido apenas pelos teus passos pesados e vazios. Nesse dia disseste-me que uma noite apenas chegaria para apagar todas as palavras, gestos e promessas e que no outro dia, quando o sol brilhasse, não restaria nem o cheiro do teu perfume na almofada… Alias, argumentas que esse cheiro nunca existiu… E eu limitei-me ao silêncio enquanto tu me bombardeavas com sons que não eram os teus, com gestos que não eram os habituais e com olhares que já nada eram meus… De repente eras mais um estranho, de repente já não eras tudo o que me fazia sentir “em casa”…. Quando, finalmente, despertei e separei os meus lábios secos e cansados, disse-te apenas “Adeus” e disse-te porque sabia que não havia volta, porque sabia que tu não voltarias ou voltarás e porque eu sei que também já não quero mais os teus silêncios.
Inspiro profundamente enquanto recordo as tuas últimas palavras, escritas no bilhete, e cada uma delas desenha uma cicatriz mais profunda que a outra… No final, quando a última coisa que recordo de ti e em ti são essas palavras, os dedos calam-se e mergulham no silêncio que tu conheces melhor que ninguém.

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Pele

Posso ser óbvia, deixar-me de filosofias e falar apenas de todas as cicatrizes que deixaste marcadas na minha pele? De todos os momentos que apenas existiram para ti e para mim?
Falo-te da sensação de ausência e vazio, desde que a tua alma de descolou da minha, da minha pele permanentemente irritada e com um forte edema desde que os teus dedos a percorrem, um a um, sem demoras, dos meus olhos que se perderam dos teus para, agora, contemplarem apenas o vazio e o silêncio, e das palavras… As palavras inseguras e inquietas que voaram e emigraram…
A minha pele é, certamente, o teu mapa… O mapa que podes tactear de olhos fechados, como um cego lê um romance em Braille (afinal o amor não é cego, é mudo)… Toca-me e lê, lê todas as linhas da nossa história e, por favor, ignora os pontos finais e todas as reticências… Também não te surpreendas quando as linhas acabarem… As cicatrizes que ainda não existem são todas aquelas que vais marcar em mim, são aquelas que vão espelhar de forma gritante a tua, a minha e a nossa essência…
As cicatrizes são muito mais do que marcas, são histórias, passados, recordações e lições de vida... Histórias de chegadas e de partidas, de desencontros e reencontros, de inicios e de fins.
As grandes histórias de amor não tem um final feliz, simplesmente porque não têm fim…

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Primeiro dia do fim

Hoje foi o último dia em que sai á rua a cantarolar o teu nome enquanto caminhava distraída nas ruas do passado, o último dia em que desenhei o teu nome no espelho, depois no banho e o último dia em que chamei de meu amor.
Depois de todas as noites de elevação e promessas, manhãs radiantes e tardes divinas, quase roçando a perfeição, dizes-me que afinal faltam os sons às palavras, o tacto aos gestos, o aroma aos cheiros, ao sorriso as gargalhadas e a todos silêncios os suspiros de paixão. Afirmas do alto do teu pedestal que não foi amor mas sim uma enorme ilusão, negas todas as tuas vontades e dizes que apenas eram minhas… Explicas toda a minha irracionalidade como quem ensina, impacientemente, contas de somar a uma criança.
Hoje é o único dia que eu jamais imaginaria no futuro, o dia em que eu finalmente te consigo dizer “não”, sem qualquer receio nem dúvida.
Hoje é o dia em que eu escolho bater a porta do destino em vez de a deixar aberta, para ti, como quem espera a eternidade…
Amanhã vai ser o primeiro dia do fim, o primeiro dia em que eu voltarei a caminhar sem qualquer caminho traçado nem destino certo.
Será apenas o primeiro dia, o primeiro dia sem ti…

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Sorriso

Se ainda consegues ver um sorriso aberto no meu rosto pálido e cansado, é porque agora sei que a tua vontade de partir é alma gémea da minha, ou seja, não existe. Eu continuo a ser a voz que queres que te embale até adormecer, a pele que te abraça quando chegas a casa exausto de mais uma das tuas intermináveis viagens e a presença, simplesmente a presença, de um serão passado em silêncio em que nos olhamos, descobrimos e lemos. Tu… Tu continuas a ocupar todo o meu lado esquerdo. O lado esquerdo da cama, o lado esquerdo do coração, o lado esquerdo da minha vida.
Finges que não me amas, amuas, fazes cara feia, bates o pé enquanto afirmas que não podemos continuar, que não temos futuro e eu acabo exausta e por te querer demais digo-te adeus, digo-te adeus porque ainda o posso fazer e continuar a amar-te, continuar a querer-te. Guardo as memórias dos nossos dias e da nossa vida e corro para a porta, e tu voltas e tomas-me novamente pela mão, como um menino assustado esperando mais uma vez que eu te diga que és importante. E eu repito-te… Encosto os meus lábios secos e hesitantes ao teu ouvido e segredo-te toda a importância que tens para mim… Fechas os olhos, como quem decora cada uma das palavras e cada tom da minha suave melodia e perguntas-me porquê? Perguntas-me porque escolho nada quando existe a opção de tudo? Porque hoje, quando temos o futuro?
Sabes a minha resposta?: Não preciso do futuro, preciso do hoje, do agora, deste instante e de todos aqueles que passaram sem que tivesses a olhar-me nos olhos… Não preciso de mais nada, porque hoje, porque quando voltas, já tenho tudo.

sábado, 12 de setembro de 2009

Sabes

Sabes o percebi hoje? As andorinhas já partiram… Chegaram em Junho, deram vida, e partiram novamente. O tempo passou e muita coisa mudou. Eu mudei, tu mudaste… Mudamos.
Sabes que já passaram os três meses das nossas conversas até de manha, os meses das noites quem eu dormia ao teu lado, sem querer e tu, acordavas comigo mesmo sem saber.
Não mudei.
Continuo com o mesmo desejo que tinha no dia em que escolheste partir. Continuo a querer-te aqui, agora e sempre em pequenos pedaços que me sabiam tão bem. Quero-te ao final da tarde, antes de jantar, em jeito de balanço do dia, em que tu me contas os problemas do teu dia e eu as banalidades do meu.
Sabes, acredito que numa destas noites em que a saudade invadir todos os teus poros e o lado esquerdo da tua cama esteja frio demais vais voltar. Vais esquecer que tu não me podes querer e vais simplesmente sentar-te ao meu lado, em silêncio, apenas para te (me) confortar.
Sabes, que mais do que acreditar, desejo. Desejo desesperadamente que chegue esse dia, e que eu consiga finalmente dar-te o último e derradeiro beijo, o beijo para guardar e para não mais desejar.
Se ainda espero por ti, meu amor, é porque sei que ainda ouves a minha voz nos sítios do costume, e ainda é a minha cara que vês quando ouves as músicas que costumavam embalar o nosso amor.
Sabes que temos todo o tempo do mundo?
Olha, sabes que te amo?