segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Esplanada

Sento-me numa daquelas cadeiras de plástico típicas de esplanada, o empregado mostrando toda a sua eficiência, praticamente galopa até à minha mesa e pergunta-me de forma alegre “o que vou desejar”… Tem piada como uma pergunta tão simples consegue criar um conflito enorme na minha cabeça. Ora bem, desejo não estar sozinha nesta mesa, debaixo de um sol tórrido tão característico das finais de tarde quentes de Lisboa, desejo que o meu telefone toque, desejo olhar para a minha mão direita ou até esquerda e ter uma aliança banal que diga que vou ser feliz e amada por um homem até ao último dos meus dias, desejo a realidade, não desejo um conto de fadas.
Fecho os olhos com a visão desta realidade inventada, esta realidade de sonhos e desejos. Lembro-me que o empregado continua especado à espera que eu lhe revele o que “desejo”, peço-lhe um sumo de laranja natural e um café.
Torno a fechar os olhos e mergulho na minha realidade. Na minha realidade tu chegas na tua carrinha de trabalho e estacionas no parque de estacionamento perto da esplanada sem que eu me dê conta, depois irás caminhar até à minha mesa, descontraidamente, distraidamente e com a sabedoria de quem conhece os segredos mais profundos de todo o Universo enquanto fumas um dos teus adorados cigarros, passarás por de trás da minha cadeira e beijarás o alto da minha cabeça enquanto afagas o meu ombro direito. Eu não me vou assustar, afinal estes gestos de carinho são de todo previsíveis, e se esta realidade não fosse inventada, eu sei que precisarias de sentir que sou real e por isso tocar-me-ias sempre. Sentas-te na cadeira em frente à minha e ficas apenas observando-me, lendo-me e desenhando-me, como quem lê um mapa e traça uma rota. Quando tivesses, finalmente, analisado atentamente cada porção de mim, humedecerias os teus lábios e com a tua voz de Frank Sinatra falsificada farias a mesma afirmação de sempre,
Conta-me o melhor do teu dia.
E eu sorriria, sorriria até conseguires ver covinhas nas minhas bochechas, sorriria pela estabilidade, por ti, por aquele momento, por nós, sorriria por todas as batalhas, por todos os poços repletos de piranhas, por todas as ausências e por todas as partidas, sorriria porque no fim apenas uma coisa importaria, nós.
Passaria a mão sob a tua e falaria, falaria até não ter mais palavras, falaríamos…