quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Silêncios

Deslizam silenciosamente pelas teclas os dedos que insististe em calar, saltitam entre uma tecla e outra procurando gritar todas as palavras que se calam e que se calarão, para sempre.
Disseste-me, quase até à exaustão, que para ti e para mim, que para nós, não existiam os silêncios e que o dia da partida não chegaria… Afirmaste-o e prometeste-o a pés juntos. E foi verdade, os silêncios não existiram e quando se calavam as palavras gritavam os olhares, os sorrisos, as sensações e tudo aquilo que não tem som junto dos ouvidos, mas junto do coração. Depois, mesmo quando as palavras já eram ditas de cor não passaram a ser mais banais nem sem significado, eram… Tesouros… Pequenas pedras preciosas que guardava no bolso do lado esquerdo, o lado mais próximo de ti. Até ao dia da enorme tempestade, o dia em que os trovões riscavam o céu, as nuvens pareciam querer atingir a Terra e no ar apenas sobrava o silêncio, o silêncio da partida, interrompido apenas pelos teus passos pesados e vazios. Nesse dia disseste-me que uma noite apenas chegaria para apagar todas as palavras, gestos e promessas e que no outro dia, quando o sol brilhasse, não restaria nem o cheiro do teu perfume na almofada… Alias, argumentas que esse cheiro nunca existiu… E eu limitei-me ao silêncio enquanto tu me bombardeavas com sons que não eram os teus, com gestos que não eram os habituais e com olhares que já nada eram meus… De repente eras mais um estranho, de repente já não eras tudo o que me fazia sentir “em casa”…. Quando, finalmente, despertei e separei os meus lábios secos e cansados, disse-te apenas “Adeus” e disse-te porque sabia que não havia volta, porque sabia que tu não voltarias ou voltarás e porque eu sei que também já não quero mais os teus silêncios.
Inspiro profundamente enquanto recordo as tuas últimas palavras, escritas no bilhete, e cada uma delas desenha uma cicatriz mais profunda que a outra… No final, quando a última coisa que recordo de ti e em ti são essas palavras, os dedos calam-se e mergulham no silêncio que tu conheces melhor que ninguém.

1 comentário: